Governança Corporativa: A Evolução dos Segmentos de Listagem

Em 2016 iniciou-se o processo de evolução dos segmentos especiais de listagem em que investidores, companhias e demais agentes do mercado poderão participar. Além das opiniões, após o foco dado ao Programa Destaque em Governança de Estatais, a BM&FBOVESPA concentra esforços em identificar as melhores práticas adotadas pelas companhias ao redor do mundo. A partir desse compilado de opiniões e estudos é que serão propostas as mudanças.

Até o mês de maio foi realizada a consulta pública e, por meio de um questionário, foi possível avaliar e propor melhorias em relação às boas práticas de governança corporativa. Haviam 38 questões sobre os mais diversos assuntos, como free float, conselho de administração, órgãos de fiscalização e controle, critérios de transparência etc. Também foi possível opinar sobre outros temas, regras e propor sugestões.

A audiência pública está acontecendo desde o dia 27 de junho e ocorrerá até 9 de setembro de 2016, a partir das opiniões coletadas na primeira etapa. A última fase, audiência restrita, tem previsão para acontecer entre 7 de novembro de 2016 e 6 de fevereiro de 2017, com participação das companhias listadas. Neste caso, as alterações somente terão efeito se aprovadas em deliberação, não havendo manifestação em contrário de um terço das empresas. Os segmentos de listagem que estão passando por melhoria são o Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1.

O Novo Mercado, principal segmento de listagem com os mais elevados padrões de governança, foi criado em 2000, com a perspectiva de redução da percepção de risco por parte dos investidores. O alinhamento com padrões internacionais poderia se refletir na valorização e liquidez das ações.

Já houveram dois processos de melhorias como o atual. Nos anos de 2006 e 2010 houve ampla participação, o que deve ocorrer também neste ano. O interesse do mercado em melhorar as regras pode ajudar a explicar por que a regulação e a autorregulação do mercado brasileiro são exemplos ao redor do mundo.

No entanto, destaco especialmente o interesse pela discussão da exigência de um comitê de auditoria estatutário. De fato, não há na Lei das S/As e nem nos regulamentos de listagem a obrigatoriedade de um órgão de fiscalização e controle com caráter permanente. Talvez, pelas recentes crises, esse assunto tem ganhado importância. Lembrando somente que na última revisão já constava essa proposta que foi rejeitada por 61 empresas que faziam parte do Novo Mercado, 21 que estavam no Nível 1 e por 7 do Nível 2. Vale acompanhar como as empresas irão se posicionar sobre isso agora. Nos Estados Unidos, por exemplo, há a obrigatoriedade do comitê de auditoria. Precisamos nos alinhar nesse quesito e considero que não termos a obrigatoriedade de um órgão de fiscalização e controle representa um ponto negativo no mercado de capitais brasileiro. Não que eu acredite que somente a obrigatoriedade vá resolver, mas transmite uma mensagem importante. É claro que as empresas que passaram e estão passando por crises corporativas têm absolutamente tudo o que do ponto de vista de governança é considerado avançado, mas isso é uma outra discussão.

Nesta edição a BM&FBOVESPA recebeu 143 respostas ao questionário, sendo que apenas 21% vieram das empresas listadas. Metade desses 21% são de empresas do Novo Mercado. É uma participação bastante tímida, tendo em vista o caráter de melhoria do ambiente como um todo. Parece que as empresas estão de um lado e o restante dos agentes do mercado estão de outro. Vamos esperar o resultado para verificar o que será aprovado ou não. O resultado anterior nos dá uma sinalização sobre o que nos resta torcer.

As crises fazem com que mudanças profundas aconteçam. Vejamos o exemplo dos EUA com a SOX. É da natureza humana trocar a fechadura por uma melhor quando uma invasão acontece. Talvez a crise atual nos ajude a melhorar alguns aspectos.

Por Rafael S. Mingone
Professor da Trevisan Escola de Negócios e coordenador do curso de graduação em administração, do MBA em Mercado de Capitais e dos programas de capacitação para conselheiros de administração. Também é professor do Instituto Educacional BM&FBOVESPA. Possui MBA em Finanças, Comunicação e Relações com Investidores pela Fipecafi. Tem experiência na implantação e coordenação de políticas e projetos relacionados à governança corporativa e relações com investidores. É Sócio-Diretor da RMG Capital e autor do livro “Capitalização de pequenas e médias empresas: Como crescer com o mercado de capitais”.