Marketing no futebol, uma parceria ganha-ganha
A busca da conciliação
A melhor maneira de gerar benefícios aos stakeholders*, onde todos saiam ganhando, é escutar todas as partes envolvidas, suas necessidades, seus interesses, entender suas limitações e particularidades e buscar, através do diálogo, uma solução que satisfaça a todos e funcione positivamente, criando um ciclo virtuoso. Não adianta simplesmente um lado querer se dar muito bem sobre outro pois, para compensar, esse outro terá que se aproveitar de um terceiro, este de um quarto, continuando assim até que o elo mais fraco se rompa, destruindo todo o processo, destruindo valor, ou ainda se fechando onde iniciou, criando um ciclo vicioso, onde no fim, ninguém ganha.
A busca de um consenso entre todas as partes interessadas no mundo do futebol é um dos fatores primordiais da Diretoria de Marketing, se não for O fator primordial.
A lista de stakeholders em um clube de futebol é enorme, não só os diretos, mas também os indiretos. A cadeia geradora de valor envolve desde a mídia, passando pelos órgãos públicos, seguindo pelas federações e confederações, jogadores, comissão técnica, corpo diretivo, sócios do clube, comunidade, outros clubes, patrocinadores, torcedores, torcidas organizadas, sócios torcedores e simpatizantes.
No caso da Mídia por exemplo, é preciso atendê-la com atenção e ajudá-la a divulgar ao máximo o produto, sem ser invasiva, mas sem afastá-la da espontaneidade necessária para transmitir a emoção da partida, dos jogadores, de tudo que envolve o evento em si.
As entrevistas coletivas se tornaram encontros pasteurizados, onde as perguntas são basicamente as mesmas e as respostas muitas vezes monotônicas e sonolentas – talvez uma zona mista no fim dos treinos possa dar vida a esse momento – mas o ideal é sentar com os profissionais do meio e buscar caminhos para atender suas demandas, e suprir suas necessidades, criando uma parceria entre o clube e a mídia especializada.
Os patrocinadores, que são responsáveis por boa parte da receita que mantém o time funcionando, ajuda a pagar salários, a contratar jogadores, tem interesses bem particulares e distintos.
É preciso entender se os objetivos do patrocinador casam com os objetivos do clube, se existe como construir uma história em comum, onde querem chegar e se esse casamento pode ser construído sobre uma base sólida e de confiança mútua, onde o clube busque atender, surpreender e até superar as expectativas dos patrocinadores com ideias para ativações positivas para ambos.
É importante se envolver por inteiro com os patrocinadores, como se clube e empresa fossem uma só. E por fim, estruturar uma relação tão positiva que outros patrocinadores tenham interesse em juntar-se ao clube e fazer parte do seu dia a dia.
Os grupos de fãs, aí envolvendo torcedores, torcidas organizadas, sócios torcedores e simpatizantes, apesar de parecer um grupo homogêneo, está longe de sê-lo e, além disso, muitas vezes uma mesma pessoa faz parte de mais de um desses grupos.
As torcidas organizadas, que estão presentes em todas as partidas, precisam ser ouvidas e entendidas em suas particularidades, afinal são eles que organizam, que puxam a festa nos estádios. Se não existissem, muito provavelmente teríamos um ambiente teatral, onde praticamente não existiria diferença entre assistir as partidas em casa ou no estádio, como já está começando a acontecer na Inglaterra. Assim, a busca de uma conciliação entre os interesses e necessidades das Organizadas e do Clube se faz através de um diálogo aberto e franco.
Já os torcedores que comparecem às partidas, querem ter segurança, tranquilidade, se divertir, participar da festa e voltar em paz. Esse grupo, sendo o maior entre os citados, pode ser ouvido através de pesquisas e, assim, encontrar a melhor maneira de mantê-los ativos, presentes e agradá-los, evitando que outros entretenimentos concorrentes os “roubem” do estádio.
Já os Sócios Torcedores, por contribuírem mensalmente com o clube, precisam ter um atendimento diferenciado, facilidade no acesso, algumas vantagens em particular e interações exclusivas com jogadores e seus ídolos.
Simpatizantes é o grupo mais complicado de ser trabalhado e atraído, pois não estão envolvidos diretamente com o esporte e participam apenas de jogos pontuais, como finais de campeonato, clássicos, e também de eventos de repercussão mundial, como Torneios Internacionais e Copa do Mundo. Então, para que estejam presentes em todos os tipos de jogos é preciso desenvolver ações que os atraiam, garantir facilidade no transporte, serviço de qualidade no estádio, acesso rápido à internet e um bom local para assistir à partida, caso contrário todas as outras diversões existentes no mundo moderno se mostrarão mais atrativas.
Os Órgãos Públicos, principalmente os de segurança, como PM, Bombeiros e Companhia de Trânsito precisam ser ouvidos e toda a estratégia para o evento ser desenhada de comum acordo, onde não se restrinja, por excesso de zelo, o interesse do organizador do evento como também não se deixe brechas desnecessárias que causem risco para os torcedores.
São muitos detalhes e particularidades. Já participei de várias reuniões de preparação na Federação e tudo o que for combinado ali, respeitando a posição de todas as partes, precisa ser cumprida com exatidão no dia do evento.
Já que citei Federação, elas, tanto quanto a Confederação, são as responsáveis por fazer valer o regulamento da competição e também observar se tudo o que foi decidido na reunião de segurança pré-jogo será respeitado durante o evento. Além disso, precisa buscar o equilíbrio de interesses entre todos os seus filiados segundo o princípio constitucional da igualdade, ou seja, “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades”.
Em um campeonato vários outros clubes de diferentes orçamentos, estilos, administrações, tamanho de audiência e de torcida se enfrentam e, cada um quer defender seu interesse. Normalmente os executivos de Marketing se entendem muito bem e buscam encontrar soluções que agradem a todos, mas é essencial que os clubes analisem e entendam seu posicionamento, qual o nicho de mercado que tem, quem são e onde querem chegar dentro de um planejamento, evitando de todas as formas o fanatismo que cega os profissionais e destrói valor aos olhos do mercado. A rivalidade deve permanecer dentro de campo, mas fora, todos precisam trabalhar juntos em busca de uma maior competitividade nos campeonatos, sem buscar a total “destruição” dos seus grandes rivais, pois essa rivalidade é um dos maiores atrativos do esporte, e acabar com seu adversário deixaria o seu time sem razão de existir, afinal, o que seria do Super-Homem sem Lex Luthor, de Batman sem Coringa, de Brasil sem Argentina, de Remo sem Paysandu?
Os sócios, conselheiros e conselhos também precisam ser ouvidos pelo Marketing, afinal são os “acionistas” do clube e ajudaram a construir a instituição. Muitos trazem histórias e conhecimento que sempre podem ajudar no contínuo engrandecimento e evolução da entidade. Em geral, desse grupo é formado o Board* com os Vice-Presidentes de pastas, Presidentes de Conselho, CEO e o Presidente eleito, que definem os objetivos a serem buscados pelo Corpo Diretivo, normalmente composto por executivos de mercado. Esse Corpo Diretivo, encabeçado pelo CEO ou Diretor Geral, definirá como serão implantados os procedimentos e executadas as tarefas para alcançar as metas definidas pelo Board.
Por fim, vamos ao Core Business* de um clube de futebol: o Departamento de Futebol.
Os jogadores, a comissão técnica e a direção executiva do departamento precisam estar em perfeita simbiose com a Área de Marketing afinal, o maior bem do clube, a maior atração e naturalmente a maior fonte de receitas está ali.
Todos precisam ser ouvidos pelo Marketing, desde o roupeiro, passando pelo corpo médico, técnico, administrativo e executivo, até os jogadores veteranos e os recém promovidos, para assim entender as limitações, particularidades e enxergar as oportunidades que podem ser aproveitadas para gerar receita – receita essa que será usada para melhorar ainda mais o departamento de futebol. E, nesse diálogo, a área de Marketing também precisa ser ouvida por todos os citados anteriormente, pois ela carrega todas as demandas de todos as partes interessadas e também a visão de como melhor desenvolver mercadologicamente o produto principal de um clube: a equipe de Futebol
*stakeholders – pessoa ou grupo de pessoas que possui participação, investimento ou interesse em determinada empresa ou negócio, resumindo, partes interessadas.
*Board – conselho formado por membros que representam acionistas. No caso de clubes de futebol representam os sócios. Não tem papel operacional, mas geralmente nomeia o Chefe Executivo (CEO) ou Diretor Geral que é quem montará a equipe de executivos que colocará em prática o que for decidido pelo Board.
*Core Business – significa a parte central, mais importante de um negócio, o ponto forte e estratégico de uma determinada empresa
Autor: Fred Mourão
Coordenador do curso de MBA em Gestão e Marketing Esportivo da Trevisan Escola de Negócios, na unidade Rio de Janeiro